24 - jan/19

Da Folha:

Carlos Juliano Barros

São Paulo

Eleito pela terceira vez consecutiva deputado federal pelo PSOL do Rio de Janeiro, Jean Wyllys vai abrir mão do novo mandato.

Em entrevista exclusiva à Folha, o parlamentar —eleito com 24.295 votos e que está fora do país, de férias— revelou que não pretende voltar ao Brasil e que vai se dedicar à carreira acadêmica.

Desde o assassinato da sua correligionária Marielle Franco, em março do ano passado, Wyllys vive sob escolta policial. Com a intensificação das ameaças de morte, comuns mesmo antes da morte da vereadora carioca, o deputado tomou a decisão de abandonar a vida pública.

“O [ex-presidente do Uruguai] Pepe Mujica, quando soube que eu estava ameaçado de morte, falou para mim: ‘Rapaz, se cuide. Os mártires não são heróis’. E é isso: eu não quero me sacrificar”, justifica.

De acordo com Wyllys, também pesaram em sua resolução de deixar o país as recentes informações de que familiares de um ex-PM suspeito de chefiar milícia investigada pela morte de Marielle trabalharam para o senador eleito Flávio Bolsonaro durante seu mandato como deputado estadual pelo Rio de Janeiro.

“Me apavora saber que o filho do presidente contratou no seu gabinete a esposa e a mãe do sicário”, afirma Wyllys.

“O presidente que sempre me difamou, que sempre me insultou de maneira aberta, que sempre utilizou de homofobia contra mim. Esse ambiente não é seguro para mim”, acrescenta.

Primeiro parlamentar assumidamente gay a encampar a agenda LGBT no Congresso Nacional, Wyllys se tornou um dos principais alvos de grupos conservadores, principalmente nas redes sociais.

Ele também se diz “quebrado por dentro” em virtude de fake news disseminadas a seu respeito, mesmo tendo vencido pelo menos cinco processos por injúria, calúnia e difamação.

“A pena imposta, por exemplo, ao Alexandre Frota não repara o dano que ele produziu ao atribuir a mim um elogio da pedofilia. Eu vi minha reputação ser destruída por mentiras e eu, impotente, sem poder fazer nada. Isso se estendendo à minha família. As pessoas não têm ideia do que é ser alvo disso”, afirmou Wyllys.

Deputado federal eleito pelo PSL de São Paulo, Frota foi condenado em primeira instância na Justiça Federal, em dezembro do ano passado, a pagar uma indenização de R$ 295 mil por postar uma foto de Jean Wyllys acompanhada de uma declaração falsa:

“A pedofilia é uma prática normal em diversas espécies de animal, anormal é o seu preconceito”.

 

Wyllys se ressente, sobretudo, da falta de liberdade no Brasil. “Como é que eu vou viver quatro anos da minha vida dentro de um carro blindado e sob escolta? Quatro anos da minha vida não podendo frequentar os lugares que eu frequento?”, questiona.

Também avisa que vai se desconectar das redes sociais temporariamente e que não pretende acompanhar a repercussão do seu anúncio.

“Essa não foi uma decisão fácil e implicou em muita dor, pois estou com isso também abrindo mão da proximidade da minha família, dos meus amigos queridos e das pessoas que gostam de mim e me queriam por perto”, explica.

Sobre o futuro, ele ainda não tem planos definidos. “Eu acho que vou até dizer que vou para Cuba”, ironiza.

A renúncia de Jean Wyllys quinta-feira (24) , vai abrir espaço na Câmara dos Deputados para o vereador David Miranda, do Rio de Janeiro.

Do mesmo partido, ambos são assumidamente gays e eram amigos da vereadora carioca Marielle Franco, também do PSOL, assassinada em março do ano passado.

Jean Wyllys vive sob escolta policial desde o crime e tomou a decisão de abandonar a vida pública por conta da intensificação das ameaças de morte, comuns mesmo antes da execução da vereadora.